O que tratamos

Este Blog discute os direitos dos jornalistas, desde os direitos trabalhistas dos jornalistas (como a jornada de trabalho de cinco horas, horas-extras, demissão etc) até a responsabilidade civil por artigos e reportagens publicados. Também vamos divulgar jurisprudências sobre o tema. Não respondemos consultas on-line.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Jornalista é obrigado a "vender férias"?

A prática é bastante comum. O jornalista trabalha o ano inteiro e planeja para o ano seguinte tirar suas sonhadas férias de 30 dias na Bahia.
Quando chega a época, o recibo de férias já vem com dez dias indenizados e apenas 20 para gozar. Se o jornalista fizer cara feia, não vai faltar recado do editor dizendo que "ele não pode deixar a redação na mão tantos dias!", "se tirar 30 dias, a gente pode não sentir mais falta", "ninguém tira 30 dias de férias aqui" etc.
A prática é ilegal.
A venda de férias é um direito do trabalhador, que ele pode ou não gozar. Jamais a empresa pode obrigar o empregado a vender férias.
Nesses casos, a Justiça tem entendimento de que o período "vendido" de forma irregular deve ser indenizado em dobro (RO nº 00805-2008-107-03-00-5 - TRT/MG). Boa sorte!

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Jornalista pode ter dois empregos - e ter todos os direitos nas duas relações de trabalho

Essa notícia é do site do TST. Ela trata de um caso muito interessante, que é a possibilidade de um jornalista trabalhar em dois empregos - e as empresas serem obrigadas a pagar todos os direitos nos dois trabalhos (carteira assinada, jornada especial etc).

No caso, o sujeito trabalhava em uma associação privada e no jornal A Tarde, da Bahia. Leia abaixo:



Um jornalista obteve na Justiça do Trabalho o reconhecimento de vínculo empregatício como assessor de imprensa do Clube de Diretores Lojistas de Salvador - CDL, embora o serviço não tenha sido prestado integralmente na instituição e não fosse exclusivo, pois o trabalhador também era empregado do Jornal A Tarde no mesmo período. A Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho não conheceu de recurso do CDL e manteve, na prática, a decisão original da Sexta Vara do Trabalho de Salvador (BA) que reconheceu o vinculo contratual.

De acordo com processo, o jornalista prestou serviços para o CDL como assessor de imprensa durante 14 anos seguidos, a partir de janeiro de 1989. Durante esse período, embora fosse empregado do Jornal A Tarde, ele divulgava informações de interesse do CDL, participava de encontros com jornalistas e viajava para atender a compromissos lojistas em todo o país. Ele ainda comparecia semanalmente à instituição, atendendo chamados da presidência e participando de jantares e almoços com a diretoria. Algumas de suas atividades eram exercidas em casa.

Ao julgar o processo, o juízo de primeiro grau reconheceu o vínculo de emprego e determinou o pagamento de todas as verbas rescisórias. De acordo com a sentença, o fato de o autor da ação ter trabalhado por mais de 14 anos seguidos no CDL afastaria qualquer discussão a respeito da natureza não eventual dos serviços. “Nota-se ainda que o pagamento de valor fixo mensal independente de quantidade de serviços prestados, com reajuste periódico, além de 13º salário, demonstram a onerosidade própria de um contrato de trabalho”, concluiu a decisão.

O CDL recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) com a alegação de que o serviço prestado pelo jornalista era autônomo, eventual e sem subordinação. A tese não foi aceita pelo Tribunal, que manteve o julgamento de primeiro grau. Para o TRT, as provas contidas no processo demonstraram que o jornalista prestou serviço com “pessoalidade, onerosidade, não-eventualidade, e subordinação jurídica (...), elementos caracterizadores da relação de emprego”.

Inconformada, a entidade recorreu, sem sucesso, ao TST. A Quinta Turma do Tribunal não conheceu do recurso de revista da instituição e manteve a decisão regional. No julgamento da SDI, que não conheceu de novo apelo do CDL (embargos em recurso de revista), ficaram vencidos os ministros Carlos Alberto Reis de Paula, João Batista Brito Pereira e Maria Cristina Peduzzi. 


(Augusto Fontenele/CF)

Processo: RR - 45640-09.2004.5.05.0006 

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Controle de ponto "britânico": o cartão de ponto já vem com a hora de entrada e saída (sem horas-extras, claro)

Em homenagem ao nosso leitor do Paraná, vou tratar de outra questão bastante comum em assessorias de imprensa, que é o controle de ponto britânico. Só no papel, claro.
O jornalista pode chegar mais cedo, sair mais tarde, esticar a jornada, mas o cartão de ponto sempre indica o mesmo horário: das 12 às 17hs, ou algo parecido. Faça chuva, sol, greve do metrô, o funcionário não falha (no papel): ele sempre chega e sai no horário certo, sem horas-extras.
E, coitado do jornalista que se recusar a assinar esse controle de ponto!
A prática é considerada até mesmo "naïve" pelos tribunais, porque considera que a justiça do trabalho acreditaria como verdadeiro um cartão de ponto impecável, assinado "em baixo" pelo empregado.
É fraude certa, que ganhou o apelido de "Controle Britânico de Jornada". Vejam essas duas decisões do TRT:

MARCAÇÃO DE PONTO. REGISTRO BRITÂNICO. Consoante entendimento consolidado pelo C. TST na Súmula 338, III, os cartões de ponto com marcação britânica são inválidos como meio de prova da jornada de trabalho, dada a condição de falibilidade humana, invertendo-se o ônus da prova relativo às horas extras, que passa a ser do empregador. Acórdão 20111120084 17a Turma - TRT2.

ÔNUS DE PROVA. CONTROLE DE JORNADA BRITÂNICO. Os cartões de ponto britânicos, que apresentam registros invariáveis de entrada e saída, são inválidos, invertendo-se o ônus da prova (Súm. 338, III, TST), cabendo à Ré desconstituir a presunção relativa de veracidade do quanto alegado na exordial. COMPENSAÇÃO. A compensação ocorre quando duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, em obrigação líquida, vencida e de coisa fungível. (artigos 368 c/c 369 do Código Civil). Na processualística trabalhista, a compensação é matéria de defesa, consoante artigo 767 da CLT. Ela é arguida, em regra, quando o crédito do empregado for igual ou superior ao do empregador. No caso, não há compensação a ser deferida. A Reclamada não demonstra ser credora em relação ao Reclamante. Recurso ordinário a que se nega provimento. Acódão 20111214577  12a Turma - TRT2.


De tão frequente, os ministros do TST, em Brasília, já editaram uma súmula a respeito do tema:


III - Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ nº 306 da SBDI-1- DJ 11.08.2003) (SUMULA 338)
Boa sorte!

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Quando o estagiário de jornalismo é "empregado"?

São bastante comuns as ofertas de "estágio" de jornalismo para recém-formados ou alunos dos últimos anos da faculdade. Como regra,a realidade é de muito trabalho e quase nenhum "direito".
Por isso, existe a lei 11.788/08, que regula atividade do estagiário "de verdade" e que considera como empregado o estagiário apenas de nome (ou seja, com todos os direitos da categoria, como jornada de 5 horas diárias):
Art. 15.  A manutenção de estagiários em desconformidade com esta Lei caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação trabalhista e previdenciária.
As ofertas pipocam em assessorias de imprensa e, claro, nas redações.
Primeiro, é preciso que a empresa (chamada de concedente) tenha um termo de acordo com a universidade onde o aluno estuda. Só por esse quesito, a gente já percebe que não cabe estágio de recém-formado. Ele só pode ser contratado.
Além disso, ele precisa ter um supervisor, enviar relatórios e a atividade tem que ser de aprendizagem. Ou seja, se você é estagiário em uma assessoria de imprensa, cuida de contas, faz clipping ou releases e se sente como apenas mão-de-obra barata é bem provável que o seu caso possa ser resolvido por seu advogado de confiança.
Veja nesse trecho de um acórdão contra uma grande revista nacional como o Tribunal Regional do Trabalho de SP tem tratado casos de "estagiários" de jornalismos. O juiz de primeiro grau havia negado a condição de jornalista ao estagiário porque ele nem diploma tinha.O tribunal reformou a decisão:

O recorrente, durante a relação jurídica, não ostentava tal título, eis que noticiou que "À época dos fatos não era jornalista profissional e não possuía MTB" (fl. 61).
Entretanto, não se pode olvidar que em sede trabalhista impera o princípio da primazia da realidade, cuja aplicação resulta em provimento positivo ao recurso.

(...)

Nessa conjuntura, em que a defesa apregoou que o reclamante era mero estagiário, sem contudo trazer aos autos o contrato respectivo, razão do acolhimento do juízo a quo da condição de empregado, será originar enriquecimento sem causa não reconhecer a ele os benefícios legais e normativos da categoria profissionaljornalista, apenas porque o requisito legal foi instituído por mera norma regulamentar não foi cumprido, uma vez que era assim classificado seu trabalho e como tal pago pelos clientes.(
TRT SP 00541.2006.006.02.00-9)
 Boa sorte!